Escrevo como simples espectadora. Não sei fazer a crítica da arte. Com ela me relaciono apenas através da emoção. E Levantado do Chão, fruto do trabalho dos alunos e profissionais da Usina de Arte João Donato, sem dúvida alguma é a demonstração do teatro que comove, que atinge o público de diversas maneiras, provocando lágrimas e risos, despertando tanto indignação quanto esperança. A história de Saramago, lindamente interpretada e cantada pelos dedicados “operários” da Usina, me fez pensar em muita gente que anda por aí a lutar por sua sobrevivência e também por um mundo mais justo, mais fraterno, onde todos possam trabalhar apenas o necessário e a ninguém falte o pão. As Saras, os Domingos, os Manuéis, os Sigismundos, as Gracindas vivem entre nós. E as Faustinas...
Uma delas eu conheci. Essa vivia no Brasil, não em Portugal. Trabalhava no campo e criava cinco filhos. Era casada com um comunista sonhador e não compartilhava com ele todas aquelas idéias “perigosas”. Tinha certo medo do que podia acontecer à família, mas ainda assim recebia em casa os amigos “sem nome” de seu marido. É, “de homens muito se tem falado”. As mulheres nem sempre estiveram nas reuniões clandestinas, nem sempre subiram aos palanques, nem sempre estiveram na linha de frente das batalhas. Mas isso não quer dizer que elas não estiveram presentes na luta, mesmo que “de costume caladas”. Quando os homens foram à guerra, quando foram presos, quando “foram desaparecidos”, as mulheres fizeram com que a vida seguisse seu rumo. João Mau-Tempo ainda tinha uma casa para onde voltar. A minha Faustina também viu seu João ser levado para a prisão sem maiores explicações. Era abril de 1964. Faustina não sabia sequer onde ficava a prisão. O medo, a angústia, deixaram-na “amalucada”. O seu João retornou e ela voltou a cuidar dele e da família. Outros nunca mais foram vistos, mas suas Faustinas e Gracindas não os esquecem.
É fato que muitas mulheres foram protagonistas em diferentes histórias. O nome de Rosa Luxemburgo pode ser evocado para representá-las. Talvez seja a esse grupo que venha juntar-se Maria Adelaide, a herdeira dos olhos de João Mau-Tempo. Mas para a história das lutas contra a opressão não podem contar apenas as heroínas. As mulheres anônimas, as que sofrem todo tipo de violência (a do latifúndio e a do marido) como Sara Mau-Tempo, que renovam a vida mesmo quando cercadas pela morte, que dão à luz aos novos seres que carregam a sina da exploração e neles alimentam a esperança de um mundo melhor, estas também participam da construção da história – mal denominada – “dos homens”. Em Levantado do Chão, é disso que nos lembram as mulheres da Usina. Mulheres caladas, amalucadas, mas também fortes e batalhadoras. A Faustina de Saramago e também a minha.
Laura Maria Loss Schwarz
infelizmente o acre é muy lejano para que eu possa assistir a peça cujas fotos e teu texto, querida prima, me deram muita vontade de assistir. sobre o texto, também gostaria de comentar que ahcie lindo o modo como falaste da tua fautina que pouco conheci.
ResponderExcluirabraço fraterno e me avise se o grupo Usina da Arte for vir mais pro sul...